domingo, 9 de novembro de 2014

Para o próximo inverno

Eu não me permito, em nenhum vão momento, sentir tua falta. Não por me sentir culpada, mas pela angústia que a lembrança dos teus olhos traz.

Teus olhos sempre tão parecidos com os meus, o jeito de sorrir, eu sempre comentei sobre a nossa semelhança, e tu sempre discordava. Bom... agora não deve haver tantas, já que faz um longo tempo que não te vejo, não ouço tua voz e não escrevo sobre ti.
As folhas verdes vivas ainda me trouxeram alguns cheiros de quando éramos tão próximos, e a tua lua aparece de vez em quando na minha janela, para me lembrar do rosto coberto do cinza que admirava as estrelas. Mas parece uma eternidade. E meu medo vem até meu colo e me questiona se será assim para a vida toda.
Foi tudo tão nublado e as ondas estavam tão fortes, tudo tão violento, não havia uma paz naquele último domingo e até as águas estavam inquietas, batiam no meu ombro e rosto como quem dá tapas pelos erros sucessivos que nos trouxeram até o fundo.
E ainda continua nublado. As paredes sentem a falta das nossas conversas, das confissões que só nós dois sabíamos, e confessando agora, eu nem queria escrever para ti!

As flores lilases do meu quarto me repudiam por tentar lembrar com ternura de algo teu. Porque depois de tudo não deve haver alguma ponta de ternura. Está tudo imbuído e sufocado, como a fumaça de nicotina adentra os pulmões e ali permanece. Está tudo asfixiado.
Justo eu que não queria perder mais ninguém, que estava na minha paz e buscando a calmaria que tanto luto em ter, acabei te deixando ir, acabei aqui querendo perdoar algo que nem meu é mais.
Meu querido deixe que as andorinhas façam mais um verão e que o alaranjado traga o outono Talvez o inverno nos reaproxime novamente. Talvez neste inverno o esbranquiçado do céu tenha nos cegado. Abra teus olhos quando tiveres coragem de encarar toda a saudade que eu guardei de ti. 

segunda-feira, 3 de novembro de 2014

A décima terceira estação

Eram verdes os olhos de quem me ensinou a amar, e quem me fez questionar todas as possíveis barreiras que poderiam existir entre o tempo e o infinito.
Porque nunca foi minha a vontade de querer, sempre tua, foram tuas palavras que deixaram a minha boca escancarada diante de tanta paixão e meu medo na ponta da língua. Houve medo. Muita temeridade e dúvidas. Houve negação e mentiras. Houve flores rosa e invernos inversos, pois dentro da gente sempre foi quente.
Aquele frio na barriga com borboletas agitadas trouxe tudo de ti até mim, como as ondas chegam ao mar, e quem recuou fui eu. De uma cor alaranjada veio a lembrança do que era, e eu já não soube lidar com o desbotamento da pele. Mudou.
As estações seguiram o plano delas, doze estações, e na décima terceira houve outros olhos e outros sorrisos. E outros medos concretizaram-se. 

Chegou a primavera e tu sabes, amor, que eu nunca soube endereçar cartas. Mas desde meu último epílogo tem sido assim: nomes, ruas e cheiros bem definidos, mas nada decidido.
Porque é tanto odor, tanto perfume que se misturou o da rosa com a orquídea amarela.
Tão belas flores amarelas que esconderam nossos beijos desse último domingo.
Está tudo muito sufocado e ainda dolorido desde o último outono retrasado. Ainda há muita fumaça mal apagada e fogo úmido.
Aperto as mãos contra o rosto e fecho os olhos num ímpeto de não deixar meus cílios denunciarem a tristeza de não saber as cores da primavera. Porque eu nunca gostei de estações coloridas. E o dia hoje foi cinza, e em cada gota de chuva havia outros olhos e outras cores mais escuras me dizendo para não ter medo. E só o que eu fiz foi me deixar molhar.

Eram escuros os olhos de quem deixou de ser, simplesmente. Houve um vazio, papel em branco, palavras sórdidas. E eu desaprendi a escrever.
Perdoa-me, amor, pela confusão, haverá outros invernos que me trarão de volta, mas hoje a cor amarela do fim da tarde me espantou.