quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Angústia


Sorria para os lábios os quais provam o sabor adocicado das lágrimas, do sal das lágrimas, do verão das lágrimas, e desse inverno fora de época. Dessa angústia fora de época, pois as folhas de outono também tombam na primavera e secam dentro da gente, a alma seca. Saibas criança, que não é passageiro, não é um ciclo, nem uma linha, são as mãos tortas. E sentimos mais frios nos dedos dos pés. Cubra seu rosto, e deixe-se choramingar pelo quarto, sim faz frio, minha criança, mas há tempestade mais forte e relâmpagos que cegam. Criança, essa lassitude não irá tirar seu sono, está tão cansada que não cerra os olhos, faz nos punhos, e luta. Dardejou o próximo tanto quanto apedrejou a parede, e este próximo era seu companheiro, era sua alma gêmea, que você deixou escapar. Sabias criança, que a angústia é alicerce para o drama na madrugada e no quiriri da noite? Sabias que o idílico lar onde habitou não existe mais? Ele não será o mesmo nem em suas póstumas memórias, nem nos seus sonhos dourados, que nunca existiram. Pois você nunca sonhou dourado, criança, já sonhou lilás e branco, talvez um laranja-outono.
Se banhe de pranto e plúmbeo, partituras de um violino quebrado, e de uma alma quebradiça. Se deixe, e voeje alto, no adormecer abra os olhos, chora e fadigue pelos escombros de um sentimento não reconhecido, ora, ninguém nunca reconhecera um pedaço de mar sem sal! Deixe os olhos vazios, e a boca aberta, irá espantar-se com o escândalo de choro e desalmados que chegaram, e quando tentares rezar, esquecerá ou o medo, ou a reza. E não tenhas medo, nunca tenhas medo. Sinta dardejas, cárceres, desamparos, mas que não haja medo. Sorria para ele, o abrace, e o deixe ir embora, deixe os cílios molhados e rabisque as mãos tortas. Em algum âmago seu, irá sentir as pinceladas de ventania misturada com ternura.
Ah... Pobre criança que balançou seu desespero e o acariciou, pobre pomba que se gelou o coração e escondeu-se no alcáçar desprotegido de um mártir. Não sintas frio, não se arrepie, nossas costas conseguem carregar mais do que nosso coração pode suportar, e carreguemos nos ombros a dor de um dia friorento, de um cobertor rasgado, de um café sem açúcar, de um amor sem flor, e de uma noite sem dialogo. Saibas, criança, que a tristeza porvindoura é ameaçadora, ora candura, ora sicária, mas ponha um chapéu, cubra os olhos, e não se esqueça da ponta dos pés. 

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Amanhecer morto

Havia uma clareia no meio da ventania e das folhas relutavam com o vento, a janela quase quebradiça ardia nos meus olhos. O vendaval cantarolava rancor, o céu de minha boca estava cinzento, nenhuma palavra fora dita. Os olhares da madrugada se viam além da vidraça, não havia inspiração do sol. O amanhecer estava enfraquecido, as nuvens se esbranquiçaram e eu admirava as borrascas de lembranças partidas. Lembrança do que não existiu. Das cores sóbrias que pintaram o céu. Que saudade do amanhecer morto!
Choramingava o pássaro pousado no galho, e meu desespero pousou nos ombros de minha alma. Trovejava a cada grito meu ensurdecido, virei amante do céu escuro de onde escorriam lágrimas. A clareia alaranjada se foi. O céu estava castanho escuro, meus olhos tiritavam de adoração ao vendaval. 
Céu negro, cinza, púmbleo, bordado com linhas de tricô envelhecidas. O sol escondeu-se enquanto eu apedrejava meu medo e me condenava a perpétua saudade da manhã que nasceu. Era uma bela paisagem mórbida para os pássaros lamentarem na chuva. A manhã não se alicerçou. Escuro.



domingo, 9 de setembro de 2012

O vento sussurra


Saibas que o vento lá fora sussurrou comigo esta noite, a chuva atrapalhava suas palavras que se confundiam com o derrame infindável de promessas sobre uivar. Mas eu o entendi, “o amor acaba”, ele dizia, e eu sorria, “eu percebo”. E o vento trovejava, e se indignava com as pancadas que as almas levam e dão, com as palavras friorentas que são ditas, e engolidas, e mastigadas! O vento também ironizou as formas de conviver, de viver, e sobreviver. Eu não sobrevivi.  Apenas relato, declamo e faço verso de toda essa dor que cai dos olhos dos outros, das mágoas que viram pena, e da tristeza que vira morte. E mata. O vento me ensinou a matar cada ponta de nostalgia e fantasia, ele soprou dizeres e poemas sobre o amor maltratado, este é o mais belo de se mostrar. De se ver, e de se rir. Deixe as pombas molharem as asas, morrer no frio e rabiscar o céu, as deixe demonstrarem dor e amor. Dedique uma música a sua amada, e dê o nome dela a uma estrela, e depois sussurre “vou embora”, deixe as rosas secarem em cima da mesa, as cortinas verdes desbotarem, e o vento acalmá-la. Como me acalmou.
A chuva goteja algo em outra língua que eu não sei dizer, e não sei explicar, na verdade nunca vou saber dizer sobre o amor, nem sobre a mágoa, muito menos sobre o perdão. Ah, perdoar! Perdoar o amor faltado, a ventania em dias quentes, a lágrima que secou e o coração que se despejou aos alicerces de algo não abstrato. Minha janela estava aberta para a pomba machucada entrar, e eu esperei, esperei horas, esperei tantas badaladas que cansei e tranquei a janela. E assim tranquei o amor, a dor, o desânimo. Pena que a mágoa ficou. E permanece aqui, ela e o vento cantarolando nas tempestades que meus olhos fazem. Quando a lágrimas quer cair e fica, e volta, e cai entre os lados da minha face.  Deixei o vento dizer-me adeus por hora, a chuva afinou e revoltou-se no horizonte, partiu para lá. E o amor ficou na janela, esperando junto à dor, o belo par. Saibas também, que eu aprendi a dizer “te amo”, e desaprendi a dizer “adeus”, não sei me despedir das pombas. Pobre alma a minha, que escreve sobre amor e só sabe sentir dor!