sexta-feira, 29 de janeiro de 2016

O céu que mapeava prantos

Fogo descresente nascendo da terra e subindo para o que chamamos de céu, e eu chamo de mapa. Mapa de cicatrizes e prantos, as nuvens me despejam fotografias e sorrisos que não me pertencem mais, e meus sorrisos, que não conseguem pertencer à ninguém, dançam na linha torta do horizonte. O riso que dura o tempo que o sol morre e dá lugar à lua - rápido, sem notarmos - vive em mim como os pelos de minha pele, e se arrepia diante das memórias guardadas na parte de trás dos olhos, acima dos cílios.
O preto nos contornos dos eucaliptos, quando nota-se visivelmente a linha que separa as folhas do céu, carrega o desespero para meus olhos e cabelos. Sou contorno das folhas escurecidas sob o céu em crepúsculo. Nunca serei manhã ou meio-dia. Me sinto como aquele resto de raio solar que vai morrendo, deixando o horizonte manchado e as sombras fracas. Não se pode diferenciar uma mágoa antiga de uma presente quando a antiga nunca sarou. As flores das manhãs são as mesmas das tardezinhas, só que sem pólen já.
Me fiz noitezinha - cansei de ser madrugada, como relatei há tempo - com o fogo minguante sendo a ponta de luz que cobre meus braços estendidos tentando alcançar as flores na margem do rio. Galhos secos e sórdidos sobem pelo fim do meu quadril pelas costas, são tão secos quanto eu me fiz, quase estalo.
Há estalos dentro de mim, nas intermitências da parede do peito, que eu ouço o barulho e deixo quebrarem-se.
Gélidos, mergulho meus pés até achar algum fundo, já tentei achar fundos e chão desesperadamente em rostos. Encontrei. Perdi o meu chão. É difícil achar caminhos quando minhas pegadas não sentem mais o fundo. É como caminhar na água e ir com a correnteza, e quando se tenta lutar contra ela, surge um redemoinho afogando mágoas e tudo que eu trancafiei. Turbilhão na superfície. As minhas margens estão alagadas. As lanternas e vaga-lumes sumiram, existe minhas mãos e meus olhos que decoraram um caminho inexistente agora. Me perco entre meus pés e o céu que não apontam para lugar algum. Eu só adentro para mim mesma e deixo minhas próprias nuvens decorarem meu céu, sórdidas e com lágrimas evaporadas. Criei minhas próprias estrelas - as mesmas que vivem no passado - depois que eu virei noite.

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