domingo, 21 de dezembro de 2014

Relato de viagem imagética l

Eu sempre me imagino viajando, não assim, em um avião, carro, ou em uma rodovia, só viajando, sem tocar o asfalto. Passando pelas cúpulas dos pinheiros, na parte alaranjada pelo crepúsculo, sobrevoando o mar, quase tocando nas cristas das ondas. Sem parar. Imagino-me viajando de qualquer forma, mas constantemente, sem pausas ou reflexões para qual destino, só indo.
Por vezes me imagino minúscula, tropeçando entre os grãos de areia, ou me equilibrando em fios das luzes de natal. Desfilando sobre eles, e os imagino cumpridos, cheios de luzinhas coloridas e eu tremitando entre elas.
Me vejo caindo abismo adentro e antes de chegar no chão acordo. Não como em sonhos, mas como na forma do desespero ser maior quando se está caindo, porque quando tomba ao chão já não tem mais emoção - nem graça.
E sempre me imaginei escrevendo por escrever - mesmo que essa seja a explicação de muitos textos meus, nunca o foi - pois sempre há um porque, um cheiro, uma dor, um som. Mas me vi agora escrevendo por imaginar. Porque me imagino inúmeras vezes perdida em uma floresta de frutas coloridas e folhas que sorriem, pétalas que mudam de cor e textura, e eu só sinto a linha se fazer, se criar. Sempre me imaginei assim, me criando instantâneamente como a palavra, resultada da tinta no papel, mas só imagino. Talvez nunca tenha de ser assim. E talvez sempre exista um porquê de cada linha em si, como se cada uma se emoldurasse de acordo com ela mesma ou com as mãos que as fazem.

Eu me imagino no branco. No nada, não livre, mas presa em um vazio branco. Pois sabe-se que é vazia, que há um rombo não preenchido. E eu que sempre me imaginei transbordante!
Não haveria de ser lúcida alguém que se imagina presa em seu próprio íntimo vazio esbranquiçado.
Sempre me imaginei - entre esses desabafos imagéticos - falando sobre amor e sol, cores e alegria. Nunca houve tamanha escala de cinza nos olhos de alguém como nos meus. Porque, no fim, eu sempre imagino tudo em tons saltitantes, mas enxergo - e escrevo - em preto e branco.

Me imagino naquele quarto de algum tempo atrás, empoeirado, fechado. Com pequenas fagulhas de sol que assaltam as frestas da janela. E aí você surgia, velho amigo, me contando sobre seus livros e estórias. Me imagino entre as linhas dos seus poemas. Visualizo entre os cílios úmidos seu rosto que tanta tristeza sentiu. Meus olhos revivem poucos momentos de paz e então não há mais. Há silêncio, mas não existe mais a calmaria de outrora.
E tenho tanta saudade. Das luzes vibrantes do natal, do calor torrente e daquelas flores. Me imagino, um dia quem sabe, sem tanta nostalgia.

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